Fico feliz que seu amigo tenha feito essa pergunta, pois todo trabalhador percebe o quão importante essa questão do desemprego é para ele. Você sabe como é sua vida quando está desempregado; e, quando tem um emprego, como o medo de perdê-lo paira sobre você. Você também sabe o perigo que representa o exército permanente de desempregados quando você entra em greve por melhores condições. Você sabe que os fura-greves são recrutados entre os desempregados que o capitalismo sempre mantém à disposição para ajudar a quebrar sua greve.
“Como o capitalismo mantém os desempregados à disposição?”, você pergunta.
Simplesmente obrigando você a trabalhar longas horas e o mais arduamente possível, para produzir a maior quantidade possível. Todos os modernos esquemas de “eficiência”, os sistemas Taylor e outros de “economia” e “racionalização” servem apenas para extrair maiores lucros do trabalhador. Trata-se de uma economia no interesse exclusivo do empregador. Mas, para você, o trabalhador, essa “economia” significa o maior gasto de esforço e energia, um desperdício fatal da sua vitalidade.
Compensa ao patrão esgotar e explorar sua força e capacidade no máximo grau. É verdade que isso arruína sua saúde e destrói seu sistema nervoso, tornando-o presa fácil de doenças (existem até doenças específicas da classe proletária), mutilando-o e levando-o a uma sepultura precoce — mas o que importa isso para o patrão? Não há milhares de desempregados esperando pelo seu emprego, prontos para ocupá-lo no momento em que você esteja incapacitado ou morto?
É por isso que é lucrativo para o capitalista manter um exército de desempregados à mão. Faz parte do sistema salarial, é uma característica necessária e inevitável dele.
É do interesse do povo que não haja desempregados, que todos tenham a oportunidade de trabalhar e ganhar seu sustento; que todos contribuam, cada um de acordo com sua capacidade e força, para aumentar a riqueza do país, para que cada um possa ter uma parte maior dela.
Mas o capitalismo não se interessa pelo bem-estar do povo. O capitalismo, como já mostrei antes, preocupa-se apenas com os lucros. Empregando menos pessoas e fazendo-as trabalhar por mais horas, é possível obter maiores lucros do que dando trabalho a mais pessoas por menos horas. É por isso que interessa ao seu patrão, por exemplo, ter 100 pessoas trabalhando 10 horas diárias em vez de empregar 200 pessoas por 5 horas. Ele precisaria de mais espaço para 200 do que para 100 pessoas — uma fábrica maior, mais ferramentas e máquinas, e assim por diante. Ou seja, exigiria um maior investimento de capital. Empregar uma força de trabalho maior com menos horas traria menos lucros, e é por isso que seu patrão não administrará sua fábrica ou loja dessa maneira. O que significa que um sistema baseado no lucro é incompatível com considerações de humanidade e bem-estar dos trabalhadores. Pelo contrário, quanto mais duro e “eficientemente” você trabalhar, e quanto mais horas permanecer nisso, melhor para seu empregador e maiores seus lucros.
Portanto, você pode ver que o capitalismo não está interessado em empregar todos aqueles que querem e podem trabalhar. Ao contrário: o princípio e o lucro do sistema capitalista são um mínimo de “mãos” e um máximo de esforço. Esse é todo o segredo de todos os esquemas de “racionalização”. E é por isso que você encontrará milhares de pessoas, em todos os países capitalistas, dispostas e ansiosas para trabalhar, mas incapazes de conseguir emprego. Esse exército de desempregados é uma ameaça constante ao seu padrão de vida. Eles estão prontos para tomar seu lugar por um salário mais baixo, porque a necessidade os obriga a isso. Isso, é claro, é muito vantajoso para o patrão: é um chicote em suas mãos, constantemente brandido sobre você, para que você se esforce ao máximo e “se comporte”.
Você mesmo pode ver como essa situação é perigosa e degradante para o trabalhador, sem falar nos outros males do sistema.
“Então por que não acabar com o desemprego?”, você pergunta.
Sim, seria ótimo acabar com ele. Mas isso só poderia ser realizado eliminando o sistema capitalista e sua escravidão assalariada. Enquanto houver capitalismo — ou qualquer outro sistema de exploração do trabalho e de obtenção de lucros — haverá desemprego. O capitalismo não pode existir sem ele: é inerente ao sistema salarial. É a condição fundamental para a produção capitalista bem-sucedida.
“Por quê?”
Porque o sistema industrial capitalista não produz para as necessidades das pessoas; ele produz para o lucro. Os fabricantes não produzem mercadorias porque as pessoas precisam delas e na quantidade necessária. Eles produzem aquilo que esperam vender, e vender com lucro.
Se tivéssemos um sistema sensato, produziríamos as coisas que as pessoas desejam e na quantidade que necessitam. Suponha que os habitantes de uma certa localidade precisem de 1.000 pares de sapatos; e suponha que tenhamos 50 sapateiros para o trabalho. Então, em 20 horas de trabalho, esses sapateiros produziriam os sapatos que nossa comunidade necessita.
Mas o sapateiro de hoje não sabe, nem se importa, com quantos pares de sapatos são necessários. Milhares de pessoas podem precisar de sapatos novos em sua cidade, mas não podem pagar por eles. Então, de que adianta ao fabricante saber quem precisa de sapatos? O que ele quer saber é quem pode comprar os sapatos que ele fabrica: quantos pares ele pode vender com lucro.
O que acontece? Bem, ele fabricará aproximadamente tantos pares de sapatos quanto acha que poderá vender. Fará o possível para produzi-los da maneira mais barata e vendê-los pelo preço mais alto possível, para obter um bom lucro. Assim, empregará o menor número de trabalhadores possível para fabricar a quantidade de sapatos que deseja, e os fará trabalhar o mais “eficientemente” e duramente possível.
Você vê que a produção para o lucro significa jornadas mais longas e menos pessoas empregadas do que seria o caso se a produção fosse para o uso.
O capitalismo é o sistema de produção para o lucro, e é por isso que o capitalismo sempre deve ter desempregados.
Mas observe mais atentamente esse sistema de produção para o lucro e verá como seu mal básico gera uma centena de outros males.
Vamos acompanhar o fabricante de sapatos de sua cidade. Ele não tem como saber, como já apontei, quem poderá ou não comprar seus sapatos. Ele faz uma estimativa grosseira, decide fabricar, digamos, 50.000 pares. Depois coloca seu produto no mercado. Ou seja, o atacadista, o distribuidor e o lojista colocam os sapatos à venda.
Suponha que apenas 30.000 pares sejam vendidos; 20.000 pares permanecem em estoque. Nosso fabricante, incapaz de vender o restante em sua própria cidade, tentará vendê-lo em outra parte do país. Mas os fabricantes de sapatos de lá também tiveram a mesma experiência. Eles também não conseguem vender tudo o que produziram. Dizem que a oferta de sapatos é maior do que a demanda. Precisam reduzir a produção. Isso significa demitir alguns funcionários, aumentando assim o exército de desempregados.
Isso é chamado de “superprodução”. Mas, na verdade, não é superprodução: é subconsumo, porque há muitas pessoas que precisam de sapatos novos, mas não têm dinheiro para comprá-los.
O resultado? Os depósitos estão abarrotados dos sapatos que as pessoas desejam mas não podem comprar; lojas e fábricas fecham por causa da “oferta excessiva”. O mesmo acontece em outras indústrias. Dizem a você que há uma “crise” e que seus salários devem ser reduzidos.
Seus salários são cortados; você é colocado em trabalho de meio período ou perde o emprego totalmente. Milhares de homens e mulheres são lançados no desemprego dessa maneira. Seus salários param e eles não podem comprar os alimentos e outras coisas de que precisam. Esses produtos estão disponíveis? Sim, há abundância deles; os depósitos e lojas estão cheios — há “superprodução”.
Portanto, o sistema capitalista de produção para o lucro resulta nessa situação absurda:
- as pessoas têm que passar fome — não porque não haja comida suficiente, mas porque há comida em excesso; elas têm que se privar das coisas de que precisam, porque há excesso desses produtos;
- por haver excesso, a produção é reduzida, jogando milhares no desemprego;
- por estarem desempregados e, portanto, sem renda, essas milhares de pessoas perdem sua capacidade de compra. O padeiro, o açougueiro, o alfaiate — todos sofrem como resultado. Isso significa aumento do desemprego em toda parte, e a crise se agrava.
No capitalismo, isso acontece em todas as indústrias.
Tais crises são inevitáveis num sistema de produção para o lucro. Elas surgem de tempos em tempos; retornam periodicamente, sempre piorando. Privam milhares e centenas de milhares de emprego, causando pobreza, sofrimento e miséria incontáveis. Resultam em falências e quebras de bancos, que absorvem o pouco que o trabalhador poupou em tempos de “prosperidade”. Geram fome e necessidade, levam pessoas ao desespero e ao crime, ao suicídio e à loucura.
Esses são os resultados da produção para o lucro; esses são os frutos do sistema capitalista.
No entanto, isso não é tudo. Existe outro resultado desse sistema, ainda pior que todos os outros juntos.
Esse resultado é a guerra.
- Informações
- Prefácio
- Introdução
- Capítulo 1 — O que você quer da vida?
- Capítulo 2 — O sistema de salários
- Capítulo 3 — Lei e governo
- Capítulo 4 — Como o sistema funciona
- Capítulo 5 — Desemprego
- Capítulo 6 — Guerra?
- Capítulo 7 — Igreja e escola
- Capítulo 8 — Justiça
- Capítulo 9 — A igreja pode ajudá-lo?
- Capítulo 10 — O reformador e o político
- Capítulo 11 — O sindicato
- Capítulo 12 — De quem é o poder?
- Capítulo 13 — Socialismo
- Capítulo 14 — A Revolução de Fevereiro
- Capítulo 15 — Entre fevereiro e outubro
- Capítulo 16 — Os bolcheviques
- Capítulo 17 — Revolução e ditadura
- Capítulo 18 — A ditadura em ação
- Capítulo 19 — O anarquismo é violência?
- Capítulo 20 — O que é o anarquismo?
- Capítulo 21 — A anarquia é possível?
- Capítulo 22 — O anarquismo comunista vai funcionar?
- Capítulo 23 — Anarquistas não-comunistas
- Capítulo 24 — Por que a revolução?
- Capítulo 25 — A ideia é o essencial
- Capítulo 26 — Preparação
- Capítulo 27 — Organização do trabalho para a revolução social
- Capítulo 28 — Princípios e prática
- Capítulo 29 — Consumo e troca
- Capítulo 30 — Produção
- Capítulo 31 — Defesa da revolução